quinta-feira, 12 de fevereiro de 2015
LUXO NUM PAÍS PAUPÉRRIMO
Um luxo num país "paupérrimo"
Transportadores de grãos reafirmam posição contra a exigência
de cavalo 6x4 para puxar bitrem
Na reportagem principal, transportadores como Cláudio Adamucho, presidente do G10, de Maringá, maior transportador de grãos do Brasil, e Miguel Mendes, diretor da ATC, de Rondonópolis, também grande no setor, diziam que são contra a exigência de cavalos 6x4 para puxar bitrens, como está previsto para entrar em vigor em 31 de outubro de 2010, porque isso vai encarecer o transporte.
No mesmo texto, representantes de montadoras exaltavam as virtudes dos 6x4, tentavam mostrar que vale a pena pagar um pouco mais (cerca de R$ 40 mil) para ganhar a força e a segurança que o 6x4 representa, em comparação com os 6x2 usados por quase todo o mundo atualmente, e diziam que o custo de uso do caminhão (principalmente combustível e manutenção) não é muito diferente do 6x2.
Pois bem. Adamucho e Mendes leram essas declarações e retornam para dizer: continuam contra a exigência de cavalo 6x4 para puxar bitrem, por várias razões. A única vantagem significativa que Adamucho vê no 6x4 é na segurança. “Tecnicamente, é um caminhão melhor”, ele admite. Mas só. E não se sensibiliza nem com argumentos como os que apresentamos a seguir, dados pelo professor João Alexandre Widmer, doutor em Engenharia de Transportes da USP de São Carlos, que já ocupou cargos em câmaras e grupos de trabalho do Denatran. O professor critica a insegurança e os danos ao asfalto provocados pelos bitrens 6x2.
O senhor acha que cavalos 6x2 são insuficientes para tracionar bitrens?
Widmer – Minha tese é de que cavalos 6x2 não deveriam tracionar mais que 45 t por razões de segurança. Basta ver o resultado do trabalho do Grupo de Estudos da Artesp/Ecovias para uso da nova pista da Imigrantes para a descida de caminhões para o Porto de Santos, coordenado pelo professor doutor Antonio Canale. O relatório está disponível na Artesp. Na descida, você precisa de freio-motor. Num cavalo 6x2, (...) em pista molhada, começa a haver escorregamento, porque um único eixo vai frear as 57 toneladas (...). Para esse PBTC, o caminhão 6x2 também não satisfaz a condição de ensaio da norma brasileira de frenagem (...), a qual prevê que uma composição deve percorrer um declive de 7% e 6 km de extensão utilizando somente o freio-motor a uma velocidade de 30 km/h. Por isso é que não deveria ter sido permitida na origem [a tração de bitrens por 6x2]. Na prática, o que fazem os fabricantes de unidades tratoras ou do terceiro eixo? Fazem um eixo que pode ser erguido com um comando na cabine. E o motorista, com pista molhada, ao sentir o escorregamento do eixo de tração, alivia o terceiro eixo e coloca dez ou mais toneladas de carga em cima do eixo trator, acelerando a deterioração do pavimento nos trechos de subida.
Mesmo diante de argumentos técnicos, Adamucho e Mendes não se inibem em confirmar sua posição contra a exigência de 6x4 no lugar de 6x2 para puxar bitrem a partir de 2010. Dizem eles:
• Sobre a segurança: “Temos no Brasil mais de 150 mil bitrens rodando e não há estatística que aponte que eles causam mais acidentes que os outros. Sob chuva, em serras, um 6x4 pode ser mais seguro. Mas, no 6x2, o motorista, sabendo que está com uma composição longa, vai se precaver mais do que o motorista do 6x4. Este, sentindo-se seguro, vai se arriscar a cometer abusos. Uma coisa compensa a outra” (Adamucho).
• Sobre danos ao asfalto: “No 6x2, a tração só é um pouco maior na hora de sair do lugar. Depois, a exigência é mínima” (Adamucho). “Em serra, o 6x2 pode prejudicar o piso, mas nós estamos numa região de chapadão, aqui é perfeitamente adequado” (Mendes).
• Sobre custos: “Discordo do que disseram os fabricantes. Um 6x4 significa 10% a mais na compra, a manutenção é mais cara porque são dois diferenciais, nossos testes práticos são de 3% a mais de consumo de combustível. É muito grande a diferença” (Adamucho). “O 6x4 pesa quase mil kg a mais, ou seja, vamos perder mil kg de carga na situação difícil que vivemos. Além disso, o 6x2 é bom de revenda. Quem tem carreta de três eixos se interessa por 6x2, mas não por 6x4” (Mendes).
• Resumindo, diz Cláudio Adamucho: “Minha discordância não é técnica. Mas estamos num país paupérrimo, com uma frota sucateada e péssimas estradas. O 6x4 é uma exigência a mais, elevam-se os custos do transporte numa realidade de fretes baixos e estradas esburacadas. A BR-163 (Santarém-PA a Tenente Portela-RS) teve nos últimos anos um aumento de 1.000% no tráfego de cargas e não fizeram nem uma terceira pista, uma melhoria no acostamento. E vamos ter um aumento de custo nas costas do transportador. Mas os outros gargalos, quem vai resolvê-los?”
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